Movimentos sociais estão criando novos assentamentos na Amazônia em meio à demora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em retomar a reforma agrária; de acordo com o Incra, cerca de 145 mil pessoas estão vivendo em acampamentos por todo o Brasil, à espera de um lote de terra.
Em uma das regiões mais violentas da Amazônia, um grupo de luta pela terra foi cercado por uma dúzia de homens armados contratados por fazendeiros.
Mesmo em assentamentos já estabelecidos, o assédio dos grileiros e a falta de apoio do governo obrigam assentados a deixarem seus lotes.
A estagnação da agenda da reforma agrária empurra a população floresta adentro, impulsionando o ciclo de desmatamento, ou então para os arredores das cidades, onde muitos vivem em condições precárias.
NOVO PROGRESSO, Pará — Julia e a filha de dois anos estavam dormindo no chão sob uma barraca de lona, em um acampamento cercado por uma dúzia de homens armados. Ainda assim, a jovem de 26 anos achava que valia a pena. “Lá era pior”, ela disse à Mongabay, referindo-se à sua cidade natal no Maranhão.
Julia vendeu seus poucos pertences, incluindo algumas galinhas, para pagar a viagem de 2 mil quilômetros para Novo Progresso, no Pará. Foi uma decisão impulsiva, tomada assim que ela recebeu uma mensagem no WhatsApp. “Uma amiga disse que o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] ia distribuir terra aqui”, ela disse.
O sonho de possuir um pedaço de terra também trouxe José para o acampamento montado a 12 km da rodovia BR-163, que conecta o estado do Mato Grosso, celeiro do Brasil, aos portos no Rio Tapajós, no Pará. Ele deixou sua família em Porto Velho, Rondônia, e viajou três dias de moto para se juntar ao movimento.
“Nós sempre trabalhamos de meeiro na terra dos outros, e metade do que colhíamos tínhamos que dar para os donos da terra”, disse José, cuja família sonha com a própria terra desde os anos 80, quando migrou de Minas Gerais para a Amazônia. “Seria uma chance de dar um conforto maior para a minha família”.
Julia e José, que pediram para que seus nomes verdadeiros fossem omitidos por razões de segurança, são como pequenas ondas de uma tsunami de migração que se abate sobre a Amazônia. Em uma região onde um punhado de fazendeiros controla áreas do tamanho de grandes cidades, movimentos sociais defendem há muito tempo que o governo federal promova uma política de distribuição de terras. Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o cargo em 2023, muitos esperavam que ele reavivasse a agenda da reforma agrária. No entanto, isso não aconteceu.
“O Brasil todo fez essa retomada [das ocupações de terra] por entender que o governo não vai fazer”, disse Rosangela Alves dos Reis, integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no estado do Pará. “Mesmo que o governo quisesse fazer a reforma agrária, ele não tem força para isso, porque tem uma bancada totalmente contrária”, ela acrescentou, referindo-se ao forte lobby do agronegócio no Congresso.
“Nos anos 90, houve um aumento na demanda por distribuição de terras na Amazônia, e agora estamos vivendo um novo ciclo, especialmente na região sudeste do Pará”, disse Ceres Hadish, da coordenação nacional do MST.

Em todo o Brasil, o Incra registrou cerca de 145 mil famílias vivendo em acampamentos à espera de um lote de terra. Isso representa um aumento de 81% em relação a 2022, quando 80 mil famílias estavam nesta situação. O Pará é o estado com o maior número de ocupações, com 29 mil famílias, muitas delas apoiadas pelo MST e também por organizações menores. Esse é o caso do acampamento de Julia e José, organizado por uma associação criada em janeiro de 2024 no distrito de Castelo dos Sonhos, às margens da BR-163.
A informação de que o grupo estava planejando um novo assentamento de reforma agrária se espalhou pelo Brasil por meio de mensagens de WhatsApp, e em poucos meses a associação tinha mais de 500 membros. A maioria é de Castelo dos Sonhos, mas também há famílias de outros estados como Maranhão, Rondônia, Mato Grosso e Goiás.
“Terra e ouro são bens que todo mundo quer”, Francisco das Neves Ferreira, presidente da associação, disse à Mongabay em nossa primeira entrevista, em abril de 2024. Mais conhecido como Goiano, ele quer que o Incra estabeleça um novo assentamento na região para as famílias associadas. Após várias reuniões infrutíferas, no entanto, ele decidiu levar o grupo para um assentamento já existente nas proximidades, o PDS Terra Nossa.
No entanto, conquistar a tão desejada terra nunca é simples quando se trata do Pará, estado campeão em conflitos agrários. Não demorou muito para que um grupo de grandes caminhonetes pretas chegasse, transportando uma equipe de 14 homens armados usando coletes à prova de balas e uniformes de uma empresa de segurança chamada Maxford.
“Quando eu cheguei achei muito bom o lugar, até pensei que a gente já iria marcar os lotes”, disse José à Mongabay. “Mas então veio a opressão, e fomos cercados.”

A empresa de segurança privada foi contratada por dois fazendeiros que, segundo o Incra, vêm ocupando ilegalmente terras dentro do PDS Terra Nossa. Um deles é Ari Friedler, que mora no Paraguai e reivindica a área onde o grupo de Goiano decidiu se instalar. Em 2008, a área de Friedler foi embargada pelo Ibama pelo desmatamento ilegal de mais de 2.500 hectares de floresta.
“[A fazenda de Friedler] está 100% dentro do PDS Terra Nossa, e essa área foi considerada uma ocupação irregular”, disse à Mongabay Antônio José Ferreira da Silva, conciliador agrário do Incra, enquanto visitava o acampamento em novembro de 2024.
O advogado de Friedler, Manoel Malinski, disse à Mongabay em uma mensagem de WhatsApp que seu cliente só falaria em juízo. A Mongabay também conversou pessoalmente com o irmão do fazendeiro, Ademar Friedler, mas ele se recusou a comentar a situação.
O segundo fazendeiro que contratou a empresa de segurança é o vizinho de Friedler, Bruno Heller, alvo de uma mega operação da Polícia Federal em agosto de 2023. Conhecido como um dos principais desmatadores da Amazônia, Heller é acusado de grilar uma área de 24 mil hectares — maior que a cidade de Boston — 7,9% dos quais se encontram dentro do PDS Terra Nossa. Os advogados de Heller não responderam ao pedido de informações da Mongabay.
A Justiça já ordenou que ambos os fazendeiros deixem a área do PDS, mas as decisões ainda não foram cumpridas.

“Temos a situação absurda de famílias com perfis de beneficiários de reforma agrária ocupando um assentamento de reforma agrária que está ilegalmente nas mãos de concentradores de terra”, disse Maurício Torres, pesquisador da Universidade Federal do Pará (UFPA) e especialista em conflitos agrários. “E não duvido, nessa lógica canhestra, que essa população venha a ser criminalizada”, ele disse à Mongabay enquanto visitava o acampamento.
Em maio de 2025, membros do acampamento acusaram Goiano de roubar dinheiro da associação e fechar um acordo com Ari Friedler pelas suas costas. A procuradora federal do Pará, Thaís Medeiros da Costa, disse à Mongabay que está ciente das acusações, mas não detalhou as medidas tomadas. A Mongabay não conseguiu entrar em contato com Goiano para ouvi-lo sobre as acusações.
Cobrindo 150 mil hectares, uma área do tamanho do município de São Paulo, o PDS Terra Nossa foi criado em 2006 para abrigar mil famílias. Dezoito anos depois, no entanto, apenas 300 têm um lote de terra. Segundo Torres, grileiros ocuparam 97% da área: “É uma situação vergonhosa”.
Uma luta perigosa
“Está mais tenso do que pensávamos”, sussurrou Silva, o servidor do Incra, ao chegar ao portão do acampamento, guardado pelos homens armados. Naquela altura, o movimento de Goiano estava cercado há três semanas. E se Silva — um homem quieto e discreto, com 18 anos de experiência em conflitos agrários — disse que a situação era tensa, é porque havia um risco real de confronto.
A porteira estava fechada, dividindo o grupo em dois. Alguns assentados ficaram do lado de dentro; se saíssem, não poderiam voltar. Outra parte ficou do lado de fora, esperando para entrar. “Estamos muito preocupados porque sabemos que esta região é muito tensa. As pessoas não brincam por aqui”, disse Silva com um meio-sorriso, enquanto tentava negociar com a empresa de segurança uma forma de reunir as duas partes do grupo para fazer uma reunião geral.
O cerco só seria levantado dez dias depois pela Polícia Federal, que executou uma decisão judicial ordenando a abertura da porteira. Enquanto isso, o Ministério Público Federal do Pará abriu uma investigação sobre a empresa de segurança.
Após a intervenção policial, as tensões diminuíram, e o grupo pôde finalmente se reunir. Em dezembro de 2024, oficiais do Incra foram ao acampamento e cadastraram 494 pessoas que a partir dali entraram oficialmente na fila da reforma agrária. Os riscos, no entanto, permanecem.
“Os grandes grileiros são perigosos”, disse à Mongabay Cícero do Espírito Santo, membro do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Castelo dos Sonhos. “Se o pessoal tentar invadir uma área, sai debaixo de chumbo. Todas as áreas onde criamos assentamentos foram retomadas de fazendeiros, e eles não gostam disso.”

Este trecho da rodovia BR-163 se estende entre os municípios de Altamira e Novo Progresso, e desde a década de 1980 vem sendo ocupado por migrantes em busca de ouro e madeira. Ao longo dos anos, mais áreas foram desmatadas para abrir espaço para gado e soja, cuja produção explodiu depois do asfaltamento da estrada nos anos 2000. O preço da terra disparou, aprofundando a violência agrária.
“É uma região onde o controle da terra é feito pela violência”, disse Torres. “Quem consegue um pedaço de terra não é quem tem o registro no cartório de imóveis; é quem é mais forte e consegue expulsar o mais fraco.”
O PDS Terra Nossa, onde o grupo de Goiano decidiu acampar, é o epicentro dessa agitação. Somente em 2018, cinco pessoas foram mortas em disputas envolvendo o assentamento, e os poucos assentados restantes vivem sob constante ameaça.
“Eles quase me pegaram”, disse à Mongabay a assentada Maria Márcia, que lidera a resistência aos grileiros dentro do PDS, apontando para a trilha que usou para escapar de sua mais recente emboscada. “Minha sorte foi que corri e me escondi na mata. Mas naquele dia, pensei que ia morrer.” Em 2020, ela quase morreu depois que um motorista jogou um caminhão sobre o carro dela na BR-163. “‘Você tem que morrer, miserável”, ela ouviu do motorista do caminhão logo após o acidente.
“Em mais de 20 anos de pesquisa, poucas vezes eu encontrei um grupo tão violentado, aterrorizado e sitiado quanto os assentados do PDS Terra Nossa”, disse Torres, que acompanha o caso há anos.

O Incra concebeu o Terra Nossa como um projeto de desenvolvimento sustentável, ou PDS. O plano era que os assentados cultivassem pequenas lavouras em seus lotes enquanto gerenciavam coletivamente uma grande área de floresta para extrair frutos, castanhas e óleos. O modelo PDS floresceu na Amazônia nos anos 2000 como uma forma de atender às famílias sem-terra e ao mesmo tempo preservar a floresta. Grileiros, no entanto, viram estas áreas como um alvo fácil e começaram a avançar sobre os assentamentos, expulsando assentados ou convencendo-os a vender seus lotes (o que é proibido pelo Incra).
“Éramos muito felizes”, disse Márcia, lembrando os poucos anos antes da chegada dos grileiros. “Era tudo floresta aqui. As mulheres andavam no meio da floresta, colhiam castanhas e açaí, e depois vendiam. Não ávamos fome”. Hoje ela conta com doações de alimentos para complementar a alimentação.
Em 2023, 45% do PDS Terra Nossa era coberto por pastagem para gado, segundo a rede da sociedade civil MapBiomas. A situação é ainda pior no PDS Brasília, um assentamento de 19.800 hectares também localizado próximo à BR-163, onde 75% da terra já foi convertida em pastagem.
O PDS Brasília possui 379 lotes, originalmente um para cada família. “Mas há uma concentração de lotes dentro do PDS”, disse Raimunda “Mariana” Rodrigues, presidente da associação de mulheres do PDS Brasília, na varanda de sua casa. “Tem gente que tem 10, 20, 50 lotes.”
Algumas famílias foram expulsas pelos grileiros. Outras venderam seus lotes por não conseguirem viver da terra sem apoio do governo. “Não adianta o Incra só jogar as pessoas lá”, disse Mariana, acrescentando que é preciso mais financiamento e assistência técnica do governo federal.

O PDS Brasília foi estabelecido em 2005, cobrindo uma área que até então era ocupada por um único fazendeiro. Assim como o PDS Terra Nossa, a história do assentamento é marcada por violência, a começar pelo sindicalista que deu nome ao PDS. Bartolomeu Moraes, mais conhecido como Brasília, foi morto em 2002 após anos de oposição a poderosos fazendeiros locais. Ele foi sequestrado, torturado e baleado com 12 tiros na cabeça.
“Aqui correu sangue para que essa área se tornasse um assentamento de agricultura familiar”, disse Mariana. “Não queremos que vire fazenda de novo”.
A longa espera pela terra
Em 20 de outubro de 2024, Rafael recebeu um telefonema de sua mãe: “‘Rafael, vamos sair hoje de madrugada para lá. Vai todo mundo. Vamos?'” Ele não pensou duas vezes: arrumou algumas roupas, pegou um pouco de comida e um pequeno fogão, e seguiu para o acampamento com os outros membros da associação.
“Há uma demanda enorme por terra aqui na região da BR-163”, disse Silva, o conciliador agrário do Incra, depois de ser recebido com aplausos e gritos de alegria em sua chegada ao assentamento.
Rafael, que mora no distrito de Castelo dos Sonhos, ou anos estudando para trabalhar na terra, primeiro formando-se técnico agrícola e depois matriculando-se em um curso de engenharia agronômica. No entanto, dificuldades financeiras o forçaram a trabalhar como mecânico enquanto nutria o sonho de cultivar maçãs, uvas e vegetais. “Pessoas com pouco poder financeiro não podem comprar um pedaço de terra”, disse o homem de 35 anos, que pediu para que seu nome verdadeiro não fosse publicado por motivos de segurança.
Muitos dos que vivem no acampamento migraram para a Amazônia décadas atrás, fugindo da pobreza ou da violência doméstica e sonhando com a terra própria. Mas eles não foram os únicos a atravessar o país em busca de oportunidades.

Fazendeiros, principalmente do sul do Brasil, também aproveitaram a oportunidade para expandir sua produção sobre as terras mais baratas da Amazônia. Essa migração começou principalmente nos anos 60 e continua até hoje, com produtores de soja do Rio Grande do Sul vindo para o Pará após terem suas terras devastadas por enchentes e secas.
“Os grandes pegaram toda a terra”, disse José, cuja família veio de Minas Gerais nos anos 80. “O Incra era para chamar meu pai [para lhe dar um lote de terra], mas nunca chamou.”
As famílias sem-terra ficam com duas opções. Algumas se aventuram mais profundamente na mata, buscando terra mais barata, e perpetuando o círculo vicioso da expansão da fronteira agrícola sobre a floresta. Outros acabam nos arredores de centros urbanos, onde lutam para sobreviver. “Muitas pessoa desabrigadas estão vivendo nas ruas”, disse Rosangela Alves dos Reis, membro do MST. “Todo esse povo está esperando que retomemos as ocupações de terra para que possam ter um lugar para plantar e viver”.
A situação piorou após a crise econômica desencadeada pela pandemia de covid-19 durante a presidência de Jair Bolsonaro (2019-2022), que estimulou a ocupação predatória da Amazônia. Esse período marcou o ponto mais baixo de uma política de reforma agrária que vinha sendo gradualmente abandonada ao longo das décadas. “O governo Bolsonaro foi a negação da reforma agrária”, disse Ceres Hadish, da coordenação nacional do MST.
O número de famílias assentadas, que, segundo o Incra, girou em torno de 45 mil por ano sob Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) e o primeiro ciclo do governo Lula (2003-2010), caiu drasticamente para cerca de 7 mil sob Dilma Rousseff (2011-2016), menos de 4 mil sob Michel Temer (2017-2018), e apenas 530 sob Bolsonaro.

Quando Lula retornou à presidência em janeiro de 2023, os movimentos sociais tinham a expectativa da retomada da reforma agrária. Até dezembro de 2024, o Incra disse à Mongabay que 52 assentamentos foram criados e 12.360 famílias receberam um lote de terra. Segundo o MST, no entanto, menos de 3.500 famílias foram destinadas a novos assentamentos até fevereiro de 2025. A organização acusa o governo de estar inflando os números ao contar como novos assentados a regularização de lotes em assentamentos já existentes.
“Estamos entrando no terceiro ano de conversas com o governo, mas efetivamente tivemos pouquíssimas entregas”, disse Hadish, acrescentando que a paralisia do governo de Lula ocorre em meio a uma nova onda de demanda por terra.
O fenômeno é confirmado não só pelos números oficiais do Incra como por dados Comissão Pastoral da Terra (T), uma organização afiliada à Igreja Católica que defende os direitos dos camponeses no Brasil. Segundo a entidade, o número de ocupações de terras por sem-terra ou comunidades tradicionais cresceu de 46 em 2019 para 124 em 2023, enquanto o número de acampamentos organizados por sem-terra para reivindicar a criação de assentamentos triplicou, ando de seis em 2019 para 18 em 2023. Em 2024, as duas contagens caíram para 78 e 10, respectivamente. O número de conflitos agrários no Brasil, no entanto, foi o mais alto da última década (1.768), com a Amazônia respondendo por 56% dos casos (995).
Um dos casos mais recentes ocorreu em maio, quando um grupo de camponeses foi expulso por pistoleiros ao tentar ocupar uma área que o governo federal retomou de um grileiro no sul do Amazonas. Segundo o portal de jornalismo local Varadouro, a retomada da terra pelo Incra criou a expectativa de criação de um novo assentamento, o que até agora não ocorreu.
“Há muita gente pressionando por novos espaços para acampamentos e ocupações de terra. Então, há uma tendência para que a luta pela reforma agrária se impulsione”, disse Hadish. O sonho de receber um pedaço de terra, segundo o MST, é visto por muitas famílias como uma oportunidade de melhorar de vida longe do alto custo das grandes cidades.”Estamos sendo muito procurados por pessoas que não têm nada”, disse Reis diretamente de Marabá, onde o MST organizou duas novas ocupações em 2024.
Em janeiro de 2025, o MST publicou uma carta denunciando o que chamou de “paralisação da reforma agrária” e exigindo que o governo Lula assentasse as mais de 100 mil famílias que esperam em acampamentos.
Terra para ser distribuída é o que não falta. A Amazônia possui 56,5 milhões de hectares de terras públicas não destinadas, uma área do tamanho da Espanha. Essas áreas pertencem aos governos federal ou estaduais e não foram convertidas em territórios indígenas ou unidades de conservação, por exemplo.
Como não têm proteção legal, estas áreas viram alvos preferenciais de grileiros que derrubam a floresta para criar gado, plantar, ou simplesmente especular com o preço da terra. “Não há negócio melhor do que vender terra pública, e o maior motor do desmatamento é a grilagem”, disse Maurício Torres, pesquisador de conflitos agrários. “Essas terras devem ser retomadas e destinadas para a reforma agrária”.
No PDS Terra Nossa, o último levantamento do Incra identificou 80 ocupações ilegais. Em março, o Ministério Público Federal do Pará entrou com uma ação judicial para forçar o Incra a finalizar os processos istrativos contra dezenas de invasores, para que então a justiça possa decidir se eles devem ou não desocupar a área.
Uma vez que isso aconteça, a preferência na distribuição das terras será das famílias que deveriam ter sido assentadas no PDS há quase vinte anos, mas foram impedidas pelos invasores. Isso significa que aqueles como Julia, José e Rafael irão para o fim da fila.
“Os acampados têm que estar cientes de que há 700 famílias esperando também. Então não é tão simples quanto pensavam”, disse Silva, do Incra. “É um pouco frustrante para nós também. Mas é a realidade, e não tem jeito”.
Imagem do banner: Goiano (na frente) iniciou o movimento de reforma agrária e tem sido alvo de ameaças de morte e denúncias de corrupção. Foto: Fernando Martinho/Mongabay